segunda-feira, dezembro 28, 2009

A "classe média" e as "mulheres a dias"

Anda para aí uma controvérsia sobre a "classe média": o que significa, quem a compõe e que padrões de rendimento e de consumo a caracterizam. As minhas aulas de "Sociologia das Classes Sociais e da Estratificação" na licenciatura em Sociologia no ISCTE são já uma memória algo distante e receio que o tema não me tenha ocupado nos últimos anos. Imagino também que as definições económicas de "classe média" não coincidam necessariamente com as definições sociológicas, e talvez por aí se explique parte (mas na verdade só uma pequena parte) da controvérsia. Se bem entendo, os economistas tendem a favorecer definições de classe média na base dos rendimentos dos indivíduos e dos agregados familiares a que pertencem. Já os sociólogos tendem a olhar para uma combinação de características, incluindo a profissão, a situação na profissão, as qualificações académicas, a posição na hierarquia profissional, a propriedade dos "meios de produção" e outras.

Mais concretamente, os economistas usam, parece-me, dois tipos de abordagem. A primeira consiste em olhar para a distribuição de rendimentos num determinado país e dizer que a "classe média" desse país é composta pelos indivíduos ou famílias cujos rendimentos se situam algures no meio dessa distribuição: o terceiro quintil (20% da população); os segundo, terceiro ou quarto quintis (60% da população); ou um intervalo qualquer em torno da mediana. Já dá para perceber que a simplicidade e aparente exactidão da abordagem coexiste com um grau considerável de arbitrariedade na definição das fronteiras entre a "classe média" e as outras classes (os 20% do meio, os 60% do meio, ou outra proporção qualquer? E porquê?). A segunda abordagem, seguida aqui, por exemplo, consiste em dizer que a classe média é composta por aqueles que estão ao mesmo tempo acima do limiar da pobreza mas que não podem mantêr-se acima desse limiar sem trabalhar (ao contrário dos "ricos", que poderiam viver de juros, rendimentos e lucros). Pelas contas de Einsenhauer, nos Estados Unidos, a "classe média" é composta por nada mais nada menos que 82% da população. Aqui haverá porventura menos arbitrariedade na estipulação do que significa "classe média", mas uma "classe social" a que pertencem 4 em cada 5 indivíduos certamente não terá, a não ser num muito alto grau de abstracção e generalidade, padrões de consumo homogéneos, para já não falar nas coisas que costumam interessar aos sociólogos (atitudes, comportamentos, identidades, valores, crenças, etc).

Os sociólogos olham para isto de outra forma, mas sem que isso signifique que o conceito "classe média" ganhe grande tracção. É certo que, em geral, para os sociólogos, "classes médias" englobam muito genericamente todos aqueles que não pertencem nem à "burguesia" (patrões, empresários, dirigentes de empresas, quadros superiores da administração pública, profissionais liberais de altos rendimentos) nem ao "proletariado" (assalariados de profissões manuais, agrícolas ou industriais). Mas esses membros da - para usar uma terminologia marxiana - "pequena burguesia" ou dos chamados "lugares contraditórios de classe" ocultam uma diversidade enorme de situações e uma proporção enorme da população ou dos agregados familiares de Portugal (nos cálculos de um trabalho recente de Cristina Roldão utilizando o European Social Survey, qualquer coisa entre 34 e 59 por cento da população, dependendo das tipologias utilizadas). Logo, não surpreende que qualquer afirmação genérica sobre a "classe média" seja sempre controversa e, em princípio, quase por definição, errada ou irrelevante. Também não surpreende que, num estudo recente sobre classes sociais na Europa escrito pelos três portugueses que mais têm estudado e escrito sobre o assunto há mais de 30 anos, o termo "classe média" não mereça sequer uma única menção: é demasiado vago, impreciso e denotativo de realidades completamente heterogéneas para dispor de utilidade descritiva ou explicativa.

Dito isto, haverá alguma coisa a dizer sobre a questão em apreço: se a maioria da classe média portuguesa emprega "mulheres a dias", a tempo parcial ou completo? Já perceberam que acho que a pergunta não faz sentido e a resposta também não fará. Mas vamos lá ver uma coisa:

1. Neste post, Paulo Pedroso sugere que um "inquérito às classes médias" mostraria que a resposta a essa questão é afirmativa. Bem, em 2002 o International Social Survey Program realizou um inquérito a amostras nacionais em vários países e estimou em 8,4% a proporção das famílias portuguesas onde a limpeza da casa é feita com a participação de "uma terceira pessoa" que não um membro do agregado familiar (incluindo, note-se, ajuda paga ou não paga, o que sobrestima em muito, como veremos, a percentagem de famílias que contratam serviços de "mulheres a dias") . Mas o mais curioso é que, quando cruzamos rendimento do agregado familiar (por escalões) com o recurso a "terceiras pessoas" para a limpeza, verificamos que a relação é curvilinear: percentagens maiores nos extremos da distribuição de rendimentos (muito maior, claro, nos rendimentos mais elevados). Por outras palavras, quem recorre menos a terceiras pessoas para a limpeza da casa são os indivíduos em agregados familiares com rendimentos...intermédios. Claro que isto não significa que os mais pobres recorram mais a "mulheres a dias" que os escalões intermédios, mas sim que, nos escalões inferiores, estamos certamente a falar em ajuda não paga. Mas lá que é irónico, é. E tudo isto, claro, completamente incompatível com a ideia de que a "maioria" das famílias de "classe média" em Portugal recorrem a este tipo de serviço, a não ser que a definição de classe média seja não só extremamente restritiva mas também diferente de qualquer noção familiar à Sociologia ou à Economia.

2. Os valores baixos - 8,4% para o total, 37% para as famílias de mais altos rendimentos (acima dos 2500 euros, dados de 2002) - podem surpreender. Mas notem: não conheço dados para Portugal, mas em Espanha - na base de inquéritos, não de estatísticas oficiais, mais falíveis nestes domínios onde está envolvido muito trabalho informal - as pessoas empregadas no trabalho doméstico representam 3,9% do total da força de trabalho, segundo um relatório da Organização Mundial do Trabalho preparado para a International Labor Conference do próximo ano. Das duas uma: ou os números para Portugal são muito maiores do que em Espanha, ou volta-se a não vislumbrar qualquer possibilidade de que uma força de trabalho com estes números tão escassos forneça serviços à maior parte de 20, 24, 59, 60 ou 82% dos lares portugueses, seja qual for a definição de "classe média" que utilizemos. Para que a resposta à pergunta inicial seja afirmativa, a definição de "classe média" teria de ser, novamente, extremamente restritiva.

Isto não retira interesse a outras questões genéricas, especialmente às diferenças entre Portugal e outros países. O valor de 8,4% (11,5% para as famílias com mulheres empregadas) é, na base do inquérito do ISSP, comparativamente alto, e é possível que nisto jogue algo do que Fernanda Câncio ou Paulo Pedroso defendem como explicações. Mas o ponto mais importante é prévio: ao contrário do que defende Paulo Pedroso, é nos factos, e não nas explicações, que começa o problema. E sem nos entendermos no explanandum, nem vale a pena perder muito tempo com o explanans.

P.S. - Sobre o assunto, ler um post de Paulo Pedroso, ao qual respondi, e outro de Elísio Estanque. Sem querer negligenciar o resto, o último parágrafo do post de EE interessou-me particularmente: ele explica de onde veio toda esta discussão e é, em si mesmo, todo um projecto de investigação.

terça-feira, dezembro 22, 2009

Novidades Trocas

No Trocas de Opinião há algumas novidades:

1. Apresentação em tempo real das ordens de venda mais baixas e de compra mais altas:



2. Organização dos contratos por temas e arquivo dos contratos já fechados:

3. E, claro, alguns novos contratos.

Sobre o modo de negociação dos contratos, bem, os responsáveis ainda não chegaram a acordo sobre se e como alterar. Entretanto, contudo, o mercado não se vem portando nada mal, prevendo correctamentre que Portugal não seria cabeça de série para o Mundial (apesar do 5º lugar no ranking da FIFA), estimando desde cedo que o treinador do Sporting seria um português e nunca contemplando a hipótese de que o BCE subisse as taxas de juro em Dezembro.

sexta-feira, dezembro 04, 2009

Eurosondagem, 25 Nov-1 Dez, N=1031, Tel.

Os resultados estão aqui. A interpretação varia. Aqui PS e PSD "seguram intenções de voto". Já aqui, "PS dilata vantagem sobre PSD". Num caso, a comparação é com a sondagem anterior. Noutro, com os resultados eleitorais.

quarta-feira, dezembro 02, 2009

Prémio "Gráficos mais assustadores do ano"

Vai directamente para as figuras 5.9 e 5.10 do estudo "A Dimensão Económica da Literacia em Portugal: Uma Análise", encomendado pelo Plano Nacional de Leitura a uma equipa chefiada por T. Scott Murray, antigo director do Statistics Canada. Ei-los:





"Os empregos altamente qualificados estão reservados aos indivíduos com mais educação, enquanto no que respeita ao resto do mercado de trabalho, as competências atingidas, reflectidas nos níveis de escolarização ou medidas na escala de literacia em prosa, têm pouco ou nenhum impacto na forma como os empregos bem remunerados são distribuídos", escreve-se na página 83.

Um mercado de trabalho que produz uma monstruosidade destas não tem defesa possível. A não ser, claro, por parte dos senhores e senhoras que ocupam o terceiro e quatro quintis.

quinta-feira, novembro 26, 2009

O que está errado com o Natal

A última edição do Planet Money, da NPR, tem uma entrevista com o economista Joel Waldfogel, autor de Scroogenomics: Why You Shouldn't Buy Presents For The Holidays. Tudo começou com um artigo da American Economic Review onde Waldfogel mostra que, segundo inquéritos aplicados a pessoas que receberam presentes, quem os oferece pagou por eles um valor superior àquele que é atribuído por quem os recebe. Entre um décimo a um terço do valor do que é comprado é destruído pelo acto da dádiva.

A solução seria dar sempre dinheiro, que aqueles que o receberiam poderiam usar para o fim que entendessem e lhes fosse mais satisfatório, evitando destruição de valor. Mas como oferecer dinheiro é socialmente sancionado, Waldfogel prevê a generalização de "cheques-brinde" ou, melhor ainda, que se ofereçam cheques-beneficência, que os destinatários poderiam usar para oferecer à instituição de caridade que entendessem. Dádivas caritativas estão altamente correlacionadas com o rendimento das pessoas, sugerindo que a beneficência é o verdadeiro "bem de luxo".

Este artigo da Economist sugere desde logo algumas razões para que a história seja um bocado mais complicada, e há uma quantidade surpreendente grande de referências que discutem este tema. Mas que o tema é fascinante, é.

quinta-feira, novembro 12, 2009

O relatório sobre as sondagens, 3ª (e última) parte

Em dois posts anteriores, divulguei e discuti algumas conclusões do relatório feito a solicitação da ERC sobre as sondagens em Portugal. No primeiro, sintetizei as principais conclusões e recomendações. No segundo, discuti as recomendações. Neste último post, atrasado por falta de tempo, abordo as principais conclusões do relatório no que respeita às próprias sondagens, seus resultados e confronto com resultados eleitorais.

Para este fim, o relatório baseia-se em 38 sondagens publicadas na semana anterior às eleições europeias de 2009 (5), regionais Madeira 2008 (3), regionais Açores 2007 (1), intercalares Lisboa 2007 (5), presidenciais 2006 (6), autárquicas Lisboa 2005 (5), autárquicas Porto 2005 (5) e legislativas 2005 (8). De seguida, os autores do relatório comparam os resultados dessas sondagens - das estimativas de intenções de voto válidas + brancos e nulos (excepto nas presidenciais, suponho) com os que vieram a ser os resultados reais. Calculam o desvio em módulo (valor absoluto) entre uns e outros e depois a média desses desvios para cada sondagem. Ficamos assim com um indicador de "precisão" de cada sondagem: "em média, os resultados deste sondagem desviaram-se dos valores reais em x".

Como a base de dados recolhida pela equipa responsável pelo relatório continha informação sobre algumas características da sondagem e da eleição respectiva, o relatório, a partir da página 23, calcula um valor médio para esse indicador de precisão por eleição, empresa/instituto de sondagens, procedimento de amostragem e técnica de recolha. As conclusões desta análise encontram-se resumidas na página 4:

"Nas sondagens, cujos dados da Ficha técnica permitiram o cálculo dos desvios em módulo entre os valores estimados através da projecção e os valores reais da eleição para os diferentes partidos (trinta e duas em trinta e oito), o desvio médio em módulo foi no conjunto de 2,3%.

Foi menor nas projecções:
- para as eleições legislativas de 2005, seguindo-se-lhes as projecções para as eleições presidenciais de 2006 e intercalares de Lisboa de 2007;
- realizadas pela empresa Ipom, seguida de Universidade Católica e Aximage;
- que utilizaram o procedimento de amostragem aleatória de selecção de freguesias tipo e último aniversariante, seguido pelos procedimentos de amostragem de selecção aleatória de indivíduo
através de “master sample” e selecção aleatória de lar e último aniversariante;
- que recorreram à entrevista pessoal;

Foi maior nas projecções
- para as eleições europeias de 2009;
- realizadas pela empresa Pitagórica, seguida da Intercampus;
- que utilizaram o procedimento de selecção “homem mais novo” - Pitagórica - e selecção aleatória de lar e quotas de indivíduo;
- que recorreram à entrevista telefónica.
"

E conclui-se também, na base destes dados, que "não existe correlação significativa entre a dimensão da amostra e a precisão das estimativas" (p. 16).

Estas conclusões do relatório da ERC fazem-me lembrar uma famosa conferência feita em 1952 por Jerzy Neyman, uma das figuras cimeiras da estatística moderna, onde contava a história de um amigo (imaginário) que recolheu dados sobre a população de cegonhas e o número de nascimentos em 54 condados dos Estados Unidos. A correlação entre o número de cegonhas e o número de bebés nascidos durante o período considerado atinge o valor de .83, próximo do limite máximo de 1 (correlação perfeita). Na conferência em causa, o amigo de Neyman sugeria que, na base dos resultados, era evidente que a presença de cegonhas estava a influenciar os nascimentos, e propunha a realização de uma experiência de controlo de natalidade, que consistia na remoção de todas as cegonhas de um sub-conjunto de condados seleccionados aleatoriamente. O problema do amigo de Neyman, claro, é que não estava a tomar em conta o facto de que o número de mulheres varia de condado para condado, e que esse número está correlacionado quer com o número de nascimentos quer com o número de cegonhas (condados maiores, mais cegonhas). Se dividirmos os condados por grupos com aproximadamente o mesmo número de mulheres e procurarmos dentro de cada um desses grupos a correlação entre cegonhas e nascimentos, essa correlação é nula. Mantendo constante uma variável de controlo (o nº de mulheres) que está relacionada quer com a suposta variável independente quer com a variável dependente, remove-se a influência dessa variável e estima-se um valor "verdadeiro" (ou "menos enviesado", pelo menos) para a relação entre o nº de cegonhas e o nº de nascimentos, neste caso, obviamente, zero.

Imaginemos agora que, por alguma razão, as eleições com maiores taxas de abstenção - Europeias, por exemplo - foram aquelas onde mais frequentemente se recorreu a entrevistas telefónicas. Não sei se é assim, mas não seria estranho. Sondagens presenciais são mais caras e obrigam a maior investimento, investimento esse que costuma ser reservado para eleições vistas como mais importantes. E imaginemos agora que as eleições com maiores taxas de abstenção são também aquelas onde os desvios entre os resultados das eleições e os resultados das sondagens são maiores. Não sei se é assim - ou melhor, até sei, por aqui e por aqui - mas imaginemos que é esse o caso. Se assim for, a afirmação do relatório de que "os desvios foram maiores nas sondagens que recorreram a entrevista telefónica", sendo factualmente correcta, é muito provavelmente irrelevante do ponto de vista da análise dos correlatos da precisão das sondagens. Tal como na relação entre cegonhas e bebés, a melhor estimação para a relação "verdadeira" entre técnica de recolha e precisão das sondagens pode muito bem ser zero. Por extensão, o mesmo pode suceder com todas as restantes afirmações sobre empresas, amostragem, etc.

A afirmação sobre a ausência de relação significativa entre a dimensão da amostra e a precisão das sondagens feita no relatório pertence à mesma categoria genérica das anteriores, ilustrando-a, contudo, de maneira diferente. Uma relação verdadeira que permanece invisível quando nos limitamos a correlacionar duas variáveis só vai aparecer quando estimamos um modelo correctamente especificado. No caso concreto, basta que as sondagens realizadas em eleições com maior abstenção - menor precisão - tenham tendencialmente usado amostras maiores para que quaisquer efeitos favoráveis da dimensão da amostra na precisão permaneçam ocultos numa simples correlação (e nem entro pelo problema de se presumir, na correlação estimada no relatório, uma relação linear entre dimensão amostral e precisão, coisa que se percebe rapidamente não poder ser esperada quando se olha para isto).

É estranho que um relatório redigido por pessoas desta qualidade, que se propõe fazer um "diagnóstico" sobre as sondagens e uma "análise" da sua "precisão" tenha optado por ignorar completamente o conceito de controlo estatístico. Só por falta de tempo se explica isto. É certo que nunca se diz no relatório que esta ou aquela metodologia produz resultados mais ou menos precisos. E é também verdade que, a certa altura, se afirma que "não se estão aqui a considerar obviamente quer as inter-relações entre esses factores quer o efeito de outros factores que se sabe afectarem os resultados, o que poderá ser objecto de outra análise mais aprofundada, se essa informação for disponibilizada". Mas este disclaimer não chega. "A análise mais aprofundada" não carecia de informação não disponibilizada. Muitos dos factores que sabe influenciarem a "precisão" das sondagens, no sentido que o relatório atribui ao termo, são conhecidos. E como sondagens não são previsões de resultados eleitorais, a sua comparação sistemática com esse resultados não pode deixar de ser feita mantendo em mente e testando, no mínimo, um modelo qualquer que inclua pelo menos alguns desses factores que fazem, muito simplesmente, com que sondagens não possam ser tratadas como previsões. E sabendo-se que o relatório ia ser lido (também) em busca de factores explicativos da precisão das sondagens, a mera enunciação de "médias" por empresa, técnica de recolha e amostragem ou a mera correlação com dimensões amostrais correu, uma vez mais, o risco de obfuscar os fenómenos em vez de os clarificar. Digo isto perfeitamente ciente de que as conclusões da ERC são muito favoráveis ao instituto que dirijo, inclusivamente do ponto de vista das técnicas de recolha e amostragem que usamos, para já não falar dos "standards" de divulgação da informação (tratados no post anterior). Mas não estaria a ser intelectualmente honesto se dissesse que estas conclusões estão correctas. Até podem estar, substantivamente falando, e ficaria contente se assim fosse. Mas o relatório fica muito aquém de o provar. É pena.

Contudo, não quero ser excessivamente negativo. Num país, digamos, maior, mais rico e com melhores universidades, nem este relatório nem este post teriam sido necessários para coisa alguma. As "bases de dados" que o relatório propõe já existiriam. Papers sobre este assunto já teriam sido escritos, discutidos em conferências, e nelas elogiados pela sua competência ou assassinados pela sua indigência. Seriam publicados em boas revistas se fossem bons, em revistas menos boas se fossem menos bons, ou em .pdf's nas páginas pessoais dos autores se fossem péssimos. Mas como vivemos num país pequeno, pobre e com más universidades, isto é melhor que nada, acho.

P.S. - Sobre a comparação entre a "abstenção real" e a "abstenção estimada" nas sondagens, que o relatório faz nas páginas 22 e 23, nem vale a pena perder muito tempo. Por um lado, a comparação é feita com recurso à abstenção oficial, e nem sequer se fez um esforço para tentar estimar um valor real (usando como denominador, por exemplo, a voting age population). Por outro lado, o relatório toma como "estimativas da abstenção" coisas que não o são, como discutido no post anterior sobre o tema.

terça-feira, novembro 10, 2009

Mais Trocas

A pedido de várias famílias, um primeiro contrato sobre Economia no Trocas: este. Em breve, vamos arrumar os contratos em temas.

domingo, novembro 08, 2009

A negociação e formação de preços no Trocas

Começou a circular há alguns dias um inquérito aos inscritos no Trocas de Opinião. Nas respostas já recebidas chegaram já muitas e boas sugestões, cuja concretização depende apenas de tempo. Somos cinco pessoas, mas todas com day jobs, pelo que a capacidade de implementar alterações é limitada. Agradecemos as vossas ideias e a vossa paciência.

Entretanto, há quem tenha levantado a questão de saber como exactamente se procede à compra e venda de contratos e como se forma o preço. Aqui vai a melhor explicação que consigo dar.

1. Uma das maneiras de perceber como isto funciona é considerar que, neste momento, estão pendentes de concretização várias centenas de ordens de compra e venda de contratos no Trocas de Opinião. Por exemplo, desde o dia 15 de Outubro que está no sistema uma ordem de compra de 400 contratos "Governo cai antes de Setembro de 2010" por 4,99 trocos. A razão pela qual este investidor continua a não conseguir comprar qualquer título com esta ordem é porque nenhuma das ordens de venda actualmente pendentes foi introduzida por pessoas dispostas a receber menos que 16 trocos. Neste momento, há até no sistema quem esteja disposto a pagar 12 trocos por cada um destes contratos. Mas como não há ninguém disposto a receber menos de 16, enquanto não aparecer alguém a querer comprar por mais e/ou alguém a querer vender por menos, este título não é transaccionado, e a sua cotação ficará pelo valor actual, 17,5 trocos, ou seja, o valor ao qual se deu o último negócio. De resto, uma das alterações prioritárias que vamos introduzir - e que vários utilizadores já tinham sugerido - é fazer com que, a qualquer momento, se possa saber para cada contrato aquilo que vos acabo de dizer: quem está disposto a comprar por mais, e quem está disposto a vender por menos.

2. Mas imaginem agora que entrava no sistema uma ordem de compra de 200 contratos "Governo cai antes de Setembro de 2010" por 18 euros. O que sucederia?

- Primeiro, o sistema verifica se o investidor que coloca a ordem tem trocos suficientes para comprar 200 contratos ao preço máximo que se dispõe pagar por cada um (e tendo em conta as ordens que já tem pendentes no sistema). Se não tiver, é avisado de que não tem trocos suficientes e a coisa fica por aí. Se tiver, passamos ao ponto seguinte.

- Segundo, o sistema verifica se o investidor tem ordens pendentes de mais de 200 contratos. Se tiver, não o deixa introduzir a nova ordem, tendo em conta a limitação de 400 contratos que introduzimos após as autárquicas, de forma a evitar o "free for all" que foram as vendas a descoberto. Mas se a ordem agora introduzida, somada às pendentes, for inferior a 400 contratos, passamos ao ponto seguinte.

- Terceiro, o sistema vai emparelhar esta ordem de compra (200 contratos a 18 trocos) com ordens de venda pendentes. Como o faz?
*Procura todas as ordens de venda com valor igual ou inferior a 18 (pessoas que estão dispostas a receber 18 ou menos trocos pelo contrato);
*Destas, escolha a que tem o valor inferior, ou seja, emparelha a ordem de compra com quem esteja disposto a receber menos pelos contratos que quer vender;
*Se houver várias ordens de venda com o mesmo valor, começa pela ordem de venda que foi introduzida no sistema há mais tempo;
* Faz o negócio pela média entre o valor mais alto que quem quer comprar está disposto a oferecer e o valor mais baixo que quem quer vender está disposto a receber. Neste caso concreto, há uma ordem de venda a 16 (a mais baixa de todas para este contrato) e foi introduzida uma ordem de compra a 18. O negócio vai fazer-se a 17 trocos.

3. Imaginem agora que quem estava a vender a 16 estava a vender apenas 100 contratos. Nesse caso, quem introduziu ordem de compra concretiza a aquisição de 100 contratos a 17 trocos mas quer ainda comprar mais 100 a, no máximo, 18 trocos. O que sucede aqui é que o algoritmo recomeça para a quantidade restante. Neste caso, não vai haver negócio, porque a ordem de venda mais alta a seguir à 16 foi uma colocada por alguém que não está disposto a receber menos de 42 trocos (safa!). Como a ordem de 200 foi colocada por alguém que não está disposto a pagar mais de 18, fica uma ordem a 18 para 100 contratos pendente.

Nos vários comentários recebidos, seja aqui seja de outras formas, há dois aspectos mais mencionados:

1. O primeiro é o facto de a cotação "passar" pelo valor das ordens de compra ou de venda de alguém sem que haja negócio. Mas se olharem para a explicação anterior, é fácil perceber como isso sucede. Imaginem que há, no exemplo anterior, uma ordem de venda por 17.25, que quem vende por 16 está a vender 100 contratos e quem compra por 18 quer comprar apenas 100. O negócio dá-se entre quem vende por 16 e quem compra por 18, a cotação baixa de 17.5 para 17, e quem vende por 17.25 não consegue vender.

2. O segundo aspecto mais controverso, relacionado com o anterior, mas mais importante, é o mecanismo de fixação do preço. Fazer pela média da melhor (mais alta) oferta de compra e da melhor (mais baixa) oferta de venda é uma hipótese, mas não é a única. Já nos sugeriram outras coisas:
- Imaginem que há duas ofertas de venda pendentes, uma a 5 e outra a 10, e que aparece uma oferta de compra a 20. Nesse caso, o negócio vai-se fazer a 12.5 entre quem oferece 20 e quem aceita 5. Mas há quem nos tenha sugerido que, havendo quem queira vender a 10, quem compra nunca devia pagar mais do que 10.
- Outra sugestão é que, no exemplo anterior, o negócio se dê também entre quem dá 20 e quem vende por 5, mas que o preço seja fixado na cotação actual do título sempre que ela se situe entre 5 e 20.

As sugestões nem são incompatíveis. Podia começar pela:
- cotação actual;
- caso a cotação esteja fora do intervalo oferta de compra mais alta - oferta de venda mais baixa, então o valor da oferta de venda mais próxima (por baixo) da oferta de compra mais alta;
- caso só haja uma oferta de venda abaixo da oferta de compra, então sim a média (o sistema actual).

Estou a perceber bem, Luís, JP e Pedro? Se calhar não. Mas se sim, que vantagem em relação ao sistema actual? Menos volatilidade? Digam coisas.

Aximage, 3-6 Nov., N=600.

Tema: Melhor candidato à liderança do PSD. 57% Marcelo, 34% Passos Coelho. Entre "eleitorado que vota tradicionalmente no PSD" (seja lá como se tenha medido isso), Marcelo reforça vantagem. Quer Marcelo quer Passos Coelho batem cada um dos restantes putativos candidatos em comparações 2 a 2. Notícia aqui.

quarta-feira, novembro 04, 2009

O relatório sobre as sondagens, 2ª parte (longo)

O relatório feito por uma comissão nomeada pela ERC para fazer um "diagnóstico sobre a situação das sondagens" foi divulgado há duas semanas. Num post anterior, disponibilizei esse relatório e um resumo das suas principais conclusões.

A primeira coisa que queria notar é o silêncio sepulcral com que as conclusões desse relatório foram recebidas, com excepção de meia-dúzia de notícias divulgadas no próprio dia. Esse silêncio era expectável, mas não por isso menos instrutivo. Nos últimos meses, foram muitas as dezenas de comentadores, políticos e bloggers, dos mais inteligentes e informados até aos semi-analfabetos, que acharam que tinham coisas interessantes e importantes para dizer sobre as sondagens, os institutos que as fazem, os seus resultados, os seus métodos e as suas consequências. Passadas as eleições, e havendo informação produzida por uma fonte independente quer dos partidos quer dos institutos de sondagens, verifica-se que quase ninguém tem nada para dizer sobre o assunto. Só se podem tirar duas conclusões. Ou todas estas pessoas foram atingidas por uma súbita falta de tempo e disponibilidade para pensar no assunto, ou então a esmagadora maioria desses comentários - com raríssimas excepções - não foram feitos por pessoas interessadas nas sondagens, na sua qualidade ou nas suas consequências. Foram feitos com motivações estrita, única e exclusivamente políticas. Não é que não se soubesse, mas é bom dispormos agora da prova categórica.

Dito isto, passemos ao relatório. Neste post, dividi as conclusões em três tipos: constatações sobre divulgação/depósito dos resultados das sondagens; constatações sobre as próprias sondagens e seus resultados; e recomendações. Quanto às primeiras, não tenho comentários para fazer. As coisas são o que são, e só resta esperar que todos se sintam alertados para algumas omissões que continuam a existir nas fichas técnicas depositadas na ERC e que contribuam para as corrigir. O mesmo não sucede quer em relação à análise dos resultados das sondagens propriamente ditos quer em relação às recomendações contidas no relatório.

Sobre as recomendações, subscrevo facilmente muitas das que são feitas: a indicação clara dos procedimentos de amostragem; a inclusão do questionário completo no depósito feito na ERC; a apresentação dos resultados em números inteiros; a indicação de todas as variáveis usadas para a ponderação pós-amostral; ou a elaboração de manuais e cursos para jornalistas. O tema do abandono das casas decimais nos resultados foi aparentemente controverso na conferência onde o relatório foi apresentado, mas Portugal deve ser dos poucos países onde isso sucede:

"The field is not an exact science, nor can it measure minute degrees of difference. Readers should be skeptical of studies that report poll results in terms as exact as two decimal places (7.03 percent, for example). Even one decimal place is usually misleading."

"The figures for the actual election result are given to the nearest decimal place, since they are real figures. The polls results, on the other hand, are expressed only as whole percentages. This is because they are estimates, subject to sampling error (...), and while it is possible to express the poll results to any number of decimal places, it is implying a spurious level of accuracy to quote a figure of 34.3%, when it is really 34.3% plus or minus 3%."


"Don't use decimals. In reporting polling numbers, you should always use whole percentages, never results with decimal points. Since these results are always subject to error, using decimals implies a precision that does not exist."


Dito isto, há recomendações com as quais não concordo:

- Em primeiro lugar, a recomendação de que, em amostras por quotas, se utilize ponderação pelo último voto. Isto significa que, nas sondagens, os inquiridos deverão ser questionados sobre o partido em que votaram nas últimas eleições e, caso haja discrepâncias entre os resultados obtidos na amostra e os resultados eleitorais reais das últimas eleições, se deve proceder a reequilíbrio amostral. Não creio que caiba à ERC, nem a uma comissão de diagnóstico nomeada pela ERC, a recomendação da adopção de opções técnicas e metodológicas cuja bondade na melhoria das estimativas não seja inequívoca. E a verdade é que não é de todo evidente que isso suceda com a ponderação por recordação de voto. O tema é controverso, há quem utilize esta ponderação e quem não a utilize, e, mais importante, não há qualquer evidência empírica para o caso português de que a sua utilização melhore os resultados. Isto não implica que não se deva discutir a sua adopção. E até possível que se conclua que, afinal, é mesmo a melhor opção no caso português. Mas é matéria para discussão e estudo, não para uma "recomendação" emanada de uma comissão nomeada pelo regulador sem bases factuais.

- O relatório sugere que, em amostras por quotas, se mencione que "o erro é desconhecido". Mas isto é enganador. É uma recomendação que, à partida, parece fundada em bases técnicas, mas é-o apenas superficialmente. É verdade que o conceito de erro amostral e a sua estimação presume amostras probabilísticas, coisa que as amostras por quotas, por definição, não são. Mas a verdade é que as amostras ditas aleatórias também não o são. Mesmo quando seleccionam números de telefone por puro random digit dialing, a incapacidade de estabelecer contacto com inquiridos que teriam sido seleccionados aleatoriamente ou de obter deles respostas faz com que a amostra deixe de ser uma amostra probabilistica do universo que se pretende e se diz representar. E em sondagens presenciais, mesmo que seleccionem localidades, domicílios e inquiridos aleatoriamente, a utilização de cluster sampling introduz erro adicional ao erro subjacente a uma amostragem puramente aleatória. Não é impossível estimar esse erro, mas é bastante complicado e, de resto, controverso. Logo, a única coisa que uma ficha técnica pode razoavelmente dizer em qualquer sondagem é aquilo que a comissão sugere na 2ª parte da sua recomendação: "Se fosse utilizado um procedimento aleatório, o erro máximo seria de x%". O erro, em rigor, é sempre desconhecido, e dizer isso apenas nas amostras por quotas é que é, isso sim, enganador.

- A indicação da percentagem de entrevistas controladas, entrevistadores inspeccionados e número de entrevistas anuladas após inspecção seria sem dúvida uma informação útil a adicionar à ficha técnica depositada na ERC. Mas iludimo-nos se pensarmos que essa informação pode ser sempre depositada antes da divulgação pública de uma sondagem pré-eleitoral. Em estudos académicos ou qualquer outro tipo de sondagem que não esteja sujeito a um calendário apertado de divulgação, não hesito em apoiar a ideia. Mas é muito frequente que, de forma a que uma sondagem seja conduzida o mais perto possível da data das eleições, minimizando diferenças entre resultados de sondagens de intenção de voto e resultados eleitorais, não sobre depois tempo para conduzir todos os controlos e inspecções antes da divulgação pública dos resultados. Logo, em muitos casos, a indicação que a comissão sugere para a ficha técnica depositada na ERC antes da divulgação pública dos resultados não pode, pura e simplesmente, ser feita.

- O relatório sugere que é importante que as fichas técnicas passem conter informação sobre "abstenção estimada". Não contesto de forma alguma que as fichas técnicas depositadas na ERC e a divulgação que é feita das sondagens junto de amostras que visam representar a totalidade dos eleitores incluam informação sobre a parte que, quando questionada sobre se vai ou não votar, responde que não o tenciona fazer. Também me inclino bastante - por achar o tema quase consensual na literatura - para que um questionário contenha sempre uma ou várias questões, separadas da questão de intenção de voto propriamente dita, destinadas a apurar a probabilidade de que um inquirido vá votar. Nuns casos, essas perguntas servirão para estimar um "eleitorado provável" de entre o conjunto de eleitores inquiridos, dando às intenções de voto desses um peso maior (ou exclusivo). Noutros casos - que me parecem pouco inventariados no relatório - parecem servir mesmo para definir a própria amostra, fazendo com que seja exclusivamente composta de "eleitores prováveis". O que já não compreendo bem é a recomendação de que se apresente sempre um valor para a "abstenção estimada". "There is no standard, widely accepted way for estimating a person's likelihood of voting. Most polling organizations combine the answers to several questions to estimate the likely electorate, and some methods work better than others". Obrigar os institutos a apresentarem as frequências das perguntas que utilizaram para estes efeitos é uma coisa. Obrigá-los a apresentar uma "estimativa" da abstenção é outra. Não creio que a segunda deva ser exigida.

- Finalmente, o relatório recomenda a criação de um "programa informático" que "passe a calcular os diferentes intervalos de confiança (com níveis de significância de 5% e 1%) e, analisando tendências, ponha em evidência dados que saiam fora dos limites previstos, alertando para a necessidade de uma análise das bases técnicas da sondagem em questão". Acho óptimo que a ERC ou seja quem for recolha e disponibilize resultados de sondagens e de todos os aspectos técnicos ligados à sua realização. De resto, a ERC vai fazendo cada vez melhor trabalho neste domínio. Mas não sei como vai a ERC compatibilizar esta recomendação do relatório, especialmente no que diz respeito aos intervalos de confiança, com esta outra:

"No caso de sondagem por quotas, a indicação da margem de erro tem um sentido meramente indicativo do erro que se correria se ela fosse probabilística. Mas como não o é, o erro pode ser muito maior, maior, menor ou muito menor, pelo que em nosso entender se deve claramente referir que “o erro é desconhecido." (p. 23)

De resto, a afirmação de que "o erro pode ser muito maior, maior, menor ou muito menor" aplica-se igualmente a amostragem aleatória. E mais importante, claro, é este conceito de "saiam fora dos limites previstos". Na base do que acabam por a ser os resultados das eleições? Ah, mas isso é matéria para o próximo post.

domingo, novembro 01, 2009

A banda sonora da minha adolescência

O primeiro responsável pela banda sonora da minha adolescência morreu ontem. Houve outros, como Ricardo Saló e Aníbal Cabrita (no "Noites de Luar"), mas António Sérgio foi o primeiro que fez com que, na altura, a música que ouvíamos fosse a coisa mais importante das nossas vidas.

Duas canções que, estou quase certo, ouvi pela primeira vez no "Som da Frente". Mais adolescente que a segunda não existe. E contudo, ainda a tenho no i-Pod.



quinta-feira, outubro 29, 2009

Um dia

Planet Money é o nome de um blog e de um podcast da National Public Radio dedicado a temas económicos, tratados de forma acessível e divertida mas nunca simplista. Não perco um podcast.

Há duas semanas, um desses podcasts foi dedicado a um funcionário da Exxon em Angola e a Minguito, um rapaz que vive nas ruas de Luanda vendendo pastilha elástica e cigarros. O dia em que um órgão de comunicação social português disser algo de semelhante ao que aqui é dito sobre Angola e o seu governo será um dia feliz para a imprensa portuguesa. Receio que esse dia não esteja para breve.

quarta-feira, outubro 28, 2009

O Trocas

Há uma série de novidades na calha para o Trocas, que serão implementadas a pouco e pouco. A principal será a introdução em tempo real das melhores ordens de venda e de compra para cada contrato, para que quem queira negociar se oriente melhor. Mais e melhores gráficos, novas formas de participação e discussão no mercado, etc.

Entretanto há um novo contrato com um novo putativo futuro líder do PSD: Morais Sarmento (e a ver se não teremos de meter outro em breve). Em geral, contudo, o mercado nunca teve certezas sobre o PSD. Foram raras transacções feitas a mais de 50. Mas importa dizer que o título mais valorizado desde o início dos contratos quase nunca deixou de ser Pedro Passos Coelho.

Relatório sobre sondagens e inquéritos de opinião

Em Julho deste ano, a ERC deliberou constituir uma comissão para efectuar um diagnóstico sobre a situação das sondagens e apresentar sugestões sobre medidas a adoptar. Essa comissão foi formada por José Vidal de Oliveira, da Escola Superior de Comunicação Social; Helena Nicolau, da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação; e Fernando Cascais, Director do CENJOR.

Essa comissão produziu um relatório que foi apresentado há dias numa conferência da ERC, apresentação essa que foi coberta pela comunicação social em várias notícias. O próprio relatório irá, ao que sei, ser publicado pela ERC, mas não se encontra ainda disponível na net. Pode ser, contudo, descarregado aqui. Esta é a que julgo ser a versão definitiva, depois de uma versão preliminar ter recebido comentários das empresas e outros interessados. O relatório baseia-se principalmente numa base de dados composta por 38 sondagens realizadas sobre 8 eleições diferentes, das legislativas de 2005 até às europeias de 2009.

Para quem não tiver paciência para ler, o que conclui este relatório? Vou dividir as conclusões em três partes: constatações sobre divulgação/depósito dos resultados das sondagens; constatações sobre as próprias sondagens e seus resultados; e recomendações.

1. Constatações sobre divulgação/depósito das sondagens e seus resultados:
- Nem sempre os universos foram correctamente definidos (faltando a algumas especificar que, em telefónicas, estamos na maioria dos casos a definir universos de residentes em lares com telefones fixos, etc.) - p.12;
- Nem sempre as fichas técnicas explicam como são seleccionados os inquiridos - p.15;
- Nem todos os questionários utilizados são disponibilizados - p.17;
- O conceito de inspecção/supervisão das entrevistas e entrevistadores não é interpretado de maneira uniforme - p. 22;
- Há fichas técnicas omissas sobre se a amostra é ou não objecto de ponderação, por que variáveis e se uma das variáveis é o último voto - p. 22;
- A análise da cobertura jornalística das sondagens revela grande visibilidade dada aos resultados, interpretação editorial colada à informação quantitativa, enquadramento competitivo, erros e excessivas simplificações e tendência para transformação de observações em prognósticos - pp. 40-41;
- Apresentação frequente das sondagens com resultados até às décimas - p.41.


2. Constatações sobre as próprias sondagens e seus resultados:
- Os procedimentos de amostragem adoptados pelas diferentes empresas, se cumpridos, não levantam objecções - p.15;
- Não existe relação entre a dimensão da amostra utilizada e a média dos desvios absolutos entre as intenções de voto estimadas para os principais partidos em sondagens pré-eleitorais e os resultados reais na eleição - p. 16;
- Nem todas as sondagens utilizam questionários onde se coloquem perguntas sobre a intenção de votar - pp.17-19;
- Existe grande disparidade do número máximo de entrevistas por entrevistador/dia nas várias empresas e institutos - p. 21;
- "Nas eleições europeias, a Marktest foi a única empresa que revelou o sentido correcto de voto entre PSD e CDS (...), o que não impediu de ser a que apresentou maior desvio médio em módulo entre o valor estimado e o valor da eleição, a nível de patidos e brancos/nulos" - p. 25;
- Os maiores desvios foram encontrados para as eleições europeias de 2009; os menores para as legislativas de 2005 - p. 27;
- Os desvios foram menores nas projecções para as legislativas de 2005 (8 sondagens), presidenciais de 2006 (6) e intercalares de Lisboa em 2007 (5); nas sondagens realizadas pelo Ipom (1), Universidade Católica (7) e Aximage (5); que utilizaram o procedimento de amostragem de selecção aleatória de freguesias tipo e último aniversariante(7); que recorreram à entrevista pessoal (17) - p. 4 e pp. 24-25.
- Os desvios foram maiores nas projecções para as europeias de 2009 (5 sondagens), feitas pela empresa Pitagórica (1), seguida da Intercampus (7); que utilizaram o procedimento de selecção "homem mais novo" (1); e que recorreram à entrevista telefónica (21) - p.4 e pp. 24-25;
- O PS e o PSD são os partidos para os quais os desvios apresentam maior variabilidade - p. 30;
- Os resultados das projecções para o PSD tenderam a ser subavaliados em todas as projecções para as autárquicas de 2005 em Lisboa e ligeiramente sobreavaliados nas projecções para as legislativas de 2005 - p.30;
- Em 6 das 8 eleições, os resultados as projecções para o PS tenderam a ser sobreavaliados - p. 30;
- Os resultados do CDS foram subavaliados em todas as projecções para as europeias de 2009 - p. 30;
- Os resultados das projecções para a CDU estão sempre muito próximos da realidade para todas as eleições em estudo - p.30;
- Os resultados das projecções para o BE estão sempre muito próximos da realidade para todas as eleições em estudo - p.30.


3. Recomendações:
- É secundária a quantificação exacta dos membros do universo - p.14;
- É desejável que as fichas técnicas indiquem de modo uniforme e mais claro o procedimento de amostragem, as variáveis de estratificação e o processo usado para selecção de unidades iniciais, intermédias e finais - p. 15;
- É importante que as fichas técnicas passem conter informação sobre "abstenção estimada" - p. 19;
- É importante que o questionário faça parte integrante da ficha técnica depositada - p.19;
- O facto de a taxa de instalação de telefone fixo não ser de 100% e a elevada taxa de posse de telefone móvel recomenda que a amostra seja composta por entrevistados com telefone fixo no lar e entrevistados com móvel sem telefone fixo no lar - p. 20;
- Sugere-se indicação na ficha técnica da percentagem de entrevistas controladas, entrevistadores inspeccionados e número de entrevistas anuladas após inspecção - p. 22;
- Necessidade de indicação de variáveis utilizadas para ponderação - p. 22;
- Em amostras por quotas, sugere-se reequilíbrio amostral por último voto - p.22;
- Em amostras por quotas, não deve ser apresentada margem de erro máxima, mas sim referir que "o erro é desconhecido. Se fosse utilizado um procedimento aleatório, o erro máximo seria de x%" - p. 23;
- Deveria ser abandonada a apresentação dos resultados até às décimas e dar mais relevo ao intervalo de confiança - p. 41;
- Republicações de resultados de sondagens deveriam fazer referência à publicação inicial, responsável e fonte - p. 42;
- Elaboração de um pequeno manual sobre procedimentos correctos e incorrectos no tratamento editorial das sondagens e criação de um curso-modelo de curta duração sobre sondagens para jornalistas - p. 56;
- Criação de um "programa informático" que, cito, "passe a calcular os diferentes intervalos de confiança (com níveis de significância de 5% e 1%) e, analisando tendências, ponha em evidência dados que saiam fora dos limites previstos, alertando para a necessidade de uma análise das bases técnicas da sondagem em questão" - p. 57.

Há outras recomendações sobre a natureza da ficha técnica a preencher pelas empresas e depositar na ERC, às quais, pela sua especificidade, vos poupo.

Como imaginam, tenho opiniões sobre tudo isto. Mas o que eu gostava mesmo era de saber o que pensam as pessoas que se interessam por este assunto, visitam este blogue e costumam comentar sondagens. Não há muitas oportunidades para debater estes assuntos fora do calor eleitoral, e esta é uma delas. Aproveitem. Daqui a uns tempos direi o que penso deste relatório e das suas conclusões.

terça-feira, outubro 20, 2009

A "raridade" dos governos minoritários e outras coisas

Anteontem, no Público, uma peça mencionava a raridade dos governos minoritários na Europa. Espanha e Portugal seriam as excepções.

Receio, contudo, que a amostra utilizada, quer em número de países considerados quer do ponto de vista do período analisado, esteja um pouco enviesada. Entre 1945 e 1999, se considerarmos 17 países da Europa Ocidental (Austria, Bélgica, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Grécia, Islândia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Holanda, Noruega, Portugal, Espanha, Suécia e Reino Unido), estiveram no poder 424 governos. 141 (33%) eram governos minoritários, e 93 (22%) eram governos minoritários de um só partido. Portugal e Espanha estão entre os casos em que estes governos foram mais frequentes, mas o mesmo sucede com a Dinamarca, França, Irlanda, Itália e Suécia. Estes dados podem ser encontrados neste livro de 2008.

Outra coisa que o livro mostra é que, obviamente, governos minoritários duram menos que governos maioritários: em média, menos um ano. E outra ainda é que, talvez menos obviamente, os partidos que lideram governos minoritários tendem a ser menos punidos em eleições subsequentes que outros tipos de governo.

Entretanto, a coisa mais conhecida sobre as consequências económicas dos governos minoritários é um antigo paper de duas pessoas hoje muito famosas, Nouriel Roubini e Jeffrey Sachs, que sugere que governos minoritários tendem a produzir défices orçamentais 1.5 pontos por ano acima do que sucede com governos maioritários. Já passou muita água debaixo da ponte depois deste artigo. Um livro de 2002 de Torsten Persson e Guido Tabellini confirma a mesma ideia (ver quadro 6.7), mas há muita discussão sobre o assunto.

segunda-feira, outubro 19, 2009

Aximage, 12-16 Outubro, N=600, Tel.

São tratados temas como a actuação dos membros do governo e dos líderes político-partidários. A escala utilizada é de 0 a 20. Entre os membros do governo, a avaliação mais alta vai para Teixeira dos Santos (média de 13) e a mais baixa para Maria de Lurdes Rodrigues (7,2). Entre os líderes partidários, a média mais alta é a de Paulo Portas (12,3) e a mais baixa a de Manuela Ferreira Leite (6). O PM é avaliado com 12,1 e o PR com 9,8. Tudo aqui e aqui.

domingo, outubro 18, 2009

Anos 70

Vale a pena ir ver a exposição no CAM, na Gulbenkian, intitulada "Anos 70: Atravessar Fronteiras". Há coisas muito boas que eu já conhecia:

Ana Hatherly

Outras que não conhecia:

Emília Nadal

E outras que só acredito que existem porque as vi com estes que a terra há-de comer:

segunda-feira, outubro 12, 2009

Rescaldo

Bem, you know the drill. Dois critérios: erro 3 (a média dos desvios absolutos entre as estimativas da sondagem - intenções de voto em sondagens pré-eleitorais, simulações de voto em sondagens à boca das urnas - e os resultados eleitorais); e erro 5 (a diferença entre a margem de vitória estimada e a margem de vitória real).

O objectivo é sempre o mesmo: coligir informação que possa ser usada para aprender alguma coisa do ponto de vista das metodologias que melhor medem atitudes políticas. Para isso, considero apenas os concelhos em que houve mais do que uma sondagem (para poder fazer algum tipo de comparação) realizada na última semana (para manter constante um factor que se sabe ser vital, a distância em relação ao acto eleitoral). Mesmo assim, dentro da última semana, há variações de alguns dias no trabalho de campo que podem não ser inconsequentes, mas não vamos agora por aí. O único concelho que excluo é Braga, porque apesar das duas sondagens, há uma que não tem elementos suficientes para se poderem apresentar resultados comparáveis.

Quanto às sondagens pré-eleitorais, aqui vai. A verde, as sondagens com menores discrepâncias entre estimativas de intenções de voto válidas e aqueles que vieram a ser os resultados, dos pontos de vista dos erros 3 e 5 (espero não haver qualquer erro em tantos números, mas se repararem nalgum avisem que será rapidamente corrigido):











O erro 3 mais elevado nas legislativas para qualquer um dos institutos foi 2, e o erro 5 mais elevado foi 2,2. Estas marcas foram ultrapassadas muitas vezes nestas autárquicas, o que confirma o que já sabíamos de eleições anteriores. Mas por outro lado, estamos longe do que se passou nas Europeias mais recentes: houve sempre consenso sobre os vencedores, e os vencedores venceram realmente. E onde não houve consenso - em Faro - não podia haver.

Nas sondagens à boca das urnas, que eu saiba, houve apenas quatro concelhos onde foram feitas mais do que duas sondagens. Não apresento os valores dos intervalos porque, curiosamente, variaram imenso entre os diferentes institutos (maiores na Intercampus, menores na Eurosondagem) e são, assim, pouco informativos. Limito-me a apresentar os pontos centrais:



Há aqui, também, casos de erros - em Matosinhos e Lisboa - maiores que os das legislativas. Mas ao mesmo tempo, duas sondagens à boca das urnas cuja precisão, creio, não voltará a ser repetida tão cedo (duas das que foram feitas no Porto). Mas notem: há nesta "precisão" - e, quem sabe, também em várias "imprecisões" - muito de imponderável. E se olharmos para os quadros, vemos que os mesmos institutos, usando os mesmos métodos e, imagina-se, com várias outras coisas em comum em todas as sondagens que fazem (formação dos inquiridores, formulações de perguntas, ponderações pós-amostrais de resultados, etc, etc, etc) são capazes de ser, ao mesmo tempo, daqueles que apresentam estimativas que mais se aproximaram dos resultados finais nalguns concelhos e, noutros, dos que menos o fizeram. É por isso que nada do que diz respeito a estes assuntos tem uma explicação óbvia. E é por isso que tudo isto é interessante (para nerds como eu e vocês que chegaram até aqui na leitura do post, obviamente).

Interessante, claro, mas com limites. O que isto merecia agora era uma análise mais aprofundada do conjunto das sondagens das autárquicas de 2009 (apesar de serem em muito menor número dos que as de 2005, o que dificultará as coisas). Talvez um dia a faça de novo com o Diogo. Mas não vai ser nem hoje, nem amanhã, nem para a semana. De sondagens, e de eleições, é agora preciso descansar. Até mais logo.

P.S. - Já me esquecia. A Intercampus ontem fez sondagens em 16 (!) concelhos. Não tive tempo para ver em detalhe como lhes correram as coisas nos que não estão tratados neste post, mas espero que bem. Uma vez o CESOP fez 14 e jurámos para nunca mais: é um esforço incrível. Só por isso, os meus parabéns.

sexta-feira, outubro 09, 2009

And now, for something completely different...

Lisboa. Intercampus, 4-7 Out., N=800, Presencial.

PS: 40,5%
PSD/CDS-PP/MPT/PPM: 36,3%
CDU: 10,5%
BE: 6,0%
OBN: 6,6%

Aqui.

Porto. Intercampus, 4-7 Out., N=800, Presencial.

PSD/CDS-PP: 43,2%
PS: 39,5%
BE: 7,8%
CDU: 7,1%
OBN: 2,4%

Aqui.

Num certo sentido, isto não é completely different. Em 2005, a vantagem de Carmona sobre Carrilho nas sondagens oscilava entre os 11 e os -0,4 pontos. Desta vez, a margem de Costa sobre Santana oscila entre os 12 e os 4,2 pontos. Em 2005, no Porto, a margem de vitória de Rio nas sondagens oscilava entre os 19 pontos e os -1,8 pontos. Desta vez, oscila entre os 20 e os 3,7 pontos.

É muito? Obviamente que sim. Tem explicação metodológica óbvia? Não tem. Está correlacionado com a proximidade em relação ao acto eleitoral? Só em parte. O que vemos aqui nada tem a ver com o que se passa nas legislativas ou nas presidenciais. Já há uma história relativamente longa disto, e alguns padrões recorrentes. Era bom que houvesse em Portugal uma comunidade académica interessada nestas coisas, não ligada a este ou aquele instituto de sondagens, que pudesse estudar isto. Há muito aqui para tentar compreender.

Matosinhos. Intercampus, 4-7 Out., N=600, Presencial.

PS: 38,6%
Narciso: 29,6%
PSD/CDS-PP: 21,1%
CDU: 4,7%
BE: 3,2%
OBN: 2,8%

Aqui.

Oeiras. Intercampus, 4-7 Out., N=600, Presencial.

Isaltino: 42,0%
PS: 25,0%
PSD/CDS-PP: 19,5%
CDU: 6,8%
BE: 3,6%
OBN: 3,1%

Aqui.

Já agora, o que diz o Trocas?

O Trocas de Opinião tem tido, nos contratos sobre as autárquicas, algumas crenças relativamente sólidas e quase inabaláveis e algumas dúvidas. Neste momento, contudo, parece ter menos dúvidas do que já teve:

1. Até agora, sempre acreditou que PSL não ganhará Lisboa. Mas a média móvel das últimas 20 cotações tem atingido valores mais altos nos últimos dias, se bem que nunca acima dos 13.

2. Também sempre acreditou que Paulo Pedroso não ganhará Almada. Só uma única transacção foi feita acima de 50. Neste momento, a cotação é 0,85.

3. Desde o início de Outubro (mais exactamente desde que saiu a primeira sondagem sobre Oeiras), o Trocas acredita que Isaltino Morais vai ganhar Oeiras. A cotação neste momento está nuns claros 93.2.

4. A probabilidade de Rui Rio ter maioria no Porto esteve, na esmagadora maioria das transacções, acima dos 60.

5. A probabilidade de Narciso Miranda ganhar Matosinhos nunca esteva acima de 50. Está neste momento a 4.

6. A probabilidade de o PSD ganhar mais de 160 câmaras nunca esteve acima dos 50. Está neste momento a 10.

Em geral, menos volatilidade que nas legislativas, devido a menos transacções (mas não muito menos, curiosamente) e também (ou especialmente) a limites impostos no volume de ordens pendentes, incluindo vendas a descoberto.

Retrospectiva e balanço

Há uns anos, eu e o Diogo Moreira, também aqui do ICS, escrevemos um artigo sobre as sondagens pré-eleitorais para as autárquicas de 2005, recorrendo ao óptimo dossier da Marktest sobre o assunto. O artigo saiu na revista Comunicação e Cultura em 2007. Em resumo, eis o que concluímos:

1. Muita concentração das sondagens publicadas nos concelhos com mais população residente (apenas 41 concelhos, mas representando 35% da população).

2. Muitos problemas na divulgação dos resultados pela imprensa (não analisámos TV ou rádio), com divulgação errática das características técnicas básicas dos estudos.

3. A média dos desvios absolutos médios entre as 86 sondagens consideradas e os resultados eleitorais foi de 4,6. Alto, tendo em conta que o erro amostral máximo que decorria da dimensão média das amostras era 4,2.

4. Os factores que mais explicaram discrepâncias entre os resultados das sondagens e o resultados das eleições (discrepâncias medidas em termos de erro absoluto médio):

- Primeiro, o básico: quanto maior o nº de partidos/listas cujas intenções de voto eram estimadas, menor o erro. Mas isto não passa de uma variável de controlo que tem a ver com a medida utilizada: ceteris paribus, o desvio absoluto médio entre sondagens e resultados há-de ser sempre maior quando esse cálculo se faz em relação a poucos partidos do que a vários (incluindo pequenos) partidos.

- Quanto maior o erro amostral máximo associado a cada sondagem (tendo em conta a dimensão da amostra), maior o desvio médio.*

- Quando teve lugar a sondagem foi importante: naturalmente, os resultados de sondagens feitas mais próximo das eleições estiveram mais próximo dos resultados destas.

- Amostragem: amostras aleatórias produziram maiores desvios que amostras por quotas (1,7 pontos acima). Isto é um bocado simplista e não sei se resistiria a uma análise mais fina e discriminada dos processos de amostragem, nem se é decorrente de um qualquer house effect ou da amostragem propriamente dita.

- Candidatos independentes: concelhos onde concorriam candidatos independentes foram concelhos onde, ceteris paribus, o desvio absoluto médio entre sondagens e resultados foram maiores (entre 2,4 e 2,5 pontos percentuais sempre que havia independentes, o que é muito).

-Telefónica vs. Presencial não fez diferença. Nem a abstenção, se bem que aqui a variância era pouca.

Enfim, uma coisa relativamente simples, pouco menos que o possível, creio, tendo em conta o reduzido número de casos, a falta de informação sobre muitas sondagens e, claro, aquilo que sabíamos fazer na altura.

Isto tudo para dizer que as sondagens que têm sido divulgadas nos últimos tempos sobre as autárquicas devem provavelmente ser vistas, do ponto de vista da sua capacidade de antecipar o que venha a acontecer no Domingo, a esta luz. Em geral, parece evidente que são bastante menos úteis para esse fim preditivo do que têm sido as sondagens sobre as legislativas, especialmente tendo em conta a tendência para usar amostras de dimensões menores e a presença aparentemente "perturbadora" das candidaturas independentes. É certo que há vários "consensos" entre as sondagens divulgadas nos últimos tempos. Mas por tudo o que está dito antes, resta saber se resistem ao que venha a suceder até Domingo.

Dito isto, quais são os "consensos" sobre as intenções de voto medidas nas últimas duas semanas?

- PS lidera intenções de voto em Lisboa. Valores de intenções de voto válidas entre 41,9 e 45%. Se recuarmos ao final de Setembro, encontramos um valor ligeiramente mais baixo, de 41,4%.

- PSD/CDS-PP lidera intenções de voto no Porto. Valores entre 46,4 e 51%. Se recuarmos a finais de Setembro, temos uma sondagem com 44,4% para Rui Rio.

- Isaltino lidera nas duas sondagens de Oeiras, com intenções de voto válidas muito semelhantes.

- Matosinhos: PS lidera, mas grande variação nas intenções de voto válidas (entre 35,2 e 43%).

- Faro: claro "empate técnico" nas três sondagens que conheço.

Sem "consenso":

- Braga: vantagem para PS numa, empate noutra.

Isto é nos concelhos onde, que eu saiba (e pode-me perfeitamente ter escapado algo) há mais do que uma sondagem, e falando apenas de quem liderava ou não nas intenções de voto. Há outros assuntos (maiorias absolutas, diferenças entre CDU e BE, etc.) sobre os quais a maioria das sondagens nem conseguia dar uma indicação estatisticamente significativa. Para o resto, o que temos - que eu conheça- está aqui no dossier da Marktest para 2009, um verdadeiro serviço público.

Outras coisas:

- Não sei se o dossier Marktest é exaustivo. Mas se for, houve muito menos sondagens do que em 2005. Possivelmente por pressão económica de um ano anormalmente pesado em eleições e sondagens.
- Terei de ver isto com mais calma, mas à primeira vista parece-me que os padrões de divulgação de informação técnica continuam a melhorar.
- Cautelas extra a ter com a utilização destas sondagens para prever o que se passará no Domingo. Por um lado, recordem que muitas destas sondagens mais recentes foram conduzidas em parte ou na totalidade em cima do "fim de semana alargado" de 3-5 Outubro. Que implicações para a representatividade das amostras? Não sabemos, mas podem ser importantes. Por outro lado, não sei se as taxas de resposta estão a ser calculadas de forma consistente por todas as empresas. Mas as indicações que tenho é que, em vários concelhos, foram baixas. Fadiga eleitoral e das sondagens? Tendência "secular" de redução de taxas de resposta? Reacção a controvérsias recentes sobre as sondagens? Tudo com consequências potencialmente sérias, mas difíceis de apreciar neste momento.

E acho que falta a Intercampus para alguns concelhos. Confirmaremos logo à noite na TVI.

E é tudo. Agora sugiro que esqueçam as sondagens e vão votar. Mas já agora, uma nota pessoal: para mim, que nasci em Lisboa e que quase sempre aqui vivi, confesso que nunca me foi tão difícil fazer uma escolha eleitoral. Continuo a achar que é uma boa cidade para viver e aqui tenciono ficar, por essa e outras razões. Mas nada do que vi me retira a sensação de que, com sorte, hei-de chegar aos 70 e, para nosso azar, esta cidade ainda estará muito, muito longe daquilo que poderia ser. Uma lástima.


*Na verdade, isto podia ter sido mais bem feitinho. Por um lado, a dimensão das sub-amostras em relação às quais se calculam intenções de voto válidas é sempre menor que a dimensão total da amostra. Por outro lado, devíamos talvez ter calculado um erro amostral médio associado à estimação de cada um dos partidos cujos resultados estão a ser comparados com as sondagens (o que provavelmente teria diminuído a importância da variável anterior). Mas sempre foi melhor do que procurar uma relação negativa entre a dimensão da amostra e o desvio, dado que essa relação não deverá ser linear.

Faro. Intercampus, 3-6 Out., N=600, Presencial

PS: 38,5%
PSD/CDS-PP/PPM/MPT: 36,2%
CDU: 8%
José Vitorino: 6,7%
BE: 6,7%

A soma dá 96,1%.

Lisboa. Aximage, 6-8 Out., N=802, Tel.

Tal como divulgado:
PS: 43,5%
PSD/CDS-PP/MPT/PPM: 37,6%
CDU: 6,3%
BE: 5,9%
OBN: 4,7%
Indecisos: 2%

Após redistribuição proporcional de indecisos:
PS: 44,4%
PSD/CDS-PP/MPT/PPM: 38,4%
CDU: 6,4%
BE: 6,0%
OBN: 4,8%

Lisboa. Marktest, 5-7 Outubro, N= 510, Tel.

PS: 45%
PSD/CDS-PP/MPT/PPM: 37,9%
CDU: 7,3%
BE: 5,4%

Isto dá 95,6%, pelo que presumo que OBN seja 4,4%. Aqui.

Matosinhos. Eurosondagem, 4-5 Outubro, N=534, Tel.

PS: 35,2% (33,2 a 37,4)
Narciso Miranda: 30,2% (28,1 a 32,3%)
PSD/CDS-PP: 21,1% (19 a 23,2%)
CDU: 6,0% (5,1 a 6,9%)
BE: 4,7% (3,8 a 5,6%)

Somado dá 97,3%.

Lisboa. Eurosondagem, 1-6 Outubro, N=1022, Tel.

PS: 41,9% (40 a 43,8%)
PSD/CDS-PP/MPT/PPM: 36,9% (35 a 38,8%)
CDU: 8,4% (7,3 a 9,5%)
BE: 8,0% (6,9 a 9,1%)

Somando dá 95,2%. Logo isto deve significar 4,8% de OBN. Aqui (mas tudo isto presumindo que os resultados certos estão no Expresso e não na SIC, onde a coligação liderada por PSL aparece com 33,3%).

Porto. CESOP-UCP, 2-5 Out., N=2571, Presencial.

O relatório-síntese pode ser descarregado aqui.

Lisboa. CESOP-UCP, 3-6 Out., N=2221, Presencial.

O relatório-síntese pode ser descarregado aqui.

quinta-feira, outubro 08, 2009

Faro. Eurosondagem, 6 Out., N=503, Tel.

PSD/CDS-PP/PPM/MPT: 40,5% (38,4 a 42,6%)
PS: 37,0% (34,9 a 39,1%)
Faro no Coração: 8,0% (7,1 a 8,9%)
CDU: 6,1% (5,3 a 6,9%)
BE: 4,8% (4,1 a 5,5%)

Soma disto dá 96,4%. Aqui.

Braga. IPOM, 5-6 Out., N=794, Tel.

PSD/CDS-PP: 31,5%
PS: 30%
CDU: 4,2%
BE: 3,1%
MPT: 0.6%
Indecisos:19,5%

Se não erro, faltam aqui 11,1% que a notícia não esclarece no que consistem.

Braga. Eurosondagem, 1-2 Outubro, N=530, Tel.

PS: 46,9% (44,8 a 49%)
PSD/CDS-PP: 36,9% (35 a 38,8%)
CDU: 6,9% (6 a 7,8%)
BE:6% (5 a 6,9%)
MPT: 0,4%

A soma disto dá 97,1%.

Aqui.

Porto. Aximage, 2-4 Outubro, N=500, Tel.

Tal como divulgada:
PSD/CDS-PP: 44,6%
PS: 33,0%
CDU: 9,3%
BE: 5,6%
OBN: 3,7%
Indecisos: 3,8%

Após redistribuição proporcional de indecisos:
PSD/CDS-PP: 46,4%
PS: 34,3%
CDU: 9,7%
BE: 5,8%
OBN: 3,8%

Matosinhos. Aximage, 4-6 Out., N=500, Tel.

Tal como divulgada:
PS: 40,7%
Narciso Miranda: 22,3%
PSD/CDS-PP: 18,1%
BE: 6,3%
CDU: 3,9%
OBN: 3,4%
Indecisos: 5,3%

Após redistribuição proporcional de indecisos:
PS: 43,0%
Narciso Miranda: 23,5%
PSD/CDS-PP: 19,1%
BE: 6,7%
CDU: 4,1%
OBN: 3,6%

Porto. Marktest, 2-7 Out., N=400, Tel.

PSD/CDS-PP: 51,0%
PS: 31,0%
CDU: 7,8%
BE: 5,7%
OBN: 4,5%

Oeiras. CESOP-UCP, 2-5 Out., N=1307, Presencial.

O relatório síntese pode ser descarregado aqui.

Matosinhos. CESOP-UCP, 2-4 Out., N=1257, Presencial.

O relatório-síntese pode ser descarregado aqui.

quarta-feira, outubro 07, 2009

Ritual

Retomando um já velho e sempre belo ritual das eleições autárquicas, venho informar que o CESOP-UCP apenas conduziu sondagens nos concelhos do Porto, Lisboa, Matosinhos e Oeiras. Tudo as restantes "sondagens da Católica" não existem, ou se existem não são da Católica.

Shameless, shameless, shameless plugs

1. Já está disponível online, na Public Choice, o artigo que escrevi com o LA-C sobre referendos e abstenção. Tudo começou com dois artigos de jornal: este e este (que, de resto, tinham sido antecedidos por um post de 2005 do LA-C no Destreza das Dúvidas). E foi uma das experiências mais interessantes em toda a minha vida profissional.


2. Dia 26 de Outubro, no ICS, terá lugar a palestra Sedas Nunes, proferida por Josep Colomer, cientista político da Pompeu Fabra e, já agora, blogger. Serão também entregues os Prémios Análise Social destinados a galardoar o melhor artigo publicado nesta revista em 2008, assim como o Prémio Especial do Júri para o melhor artigo publicado, também na Análise Social, por um jovem investigador. O júri, presidido por Jaime Reis (ICS), é composto por Jorge Flores (U. Brown), Peter Fry (U. Federal Rio de Janeiro) e Philippe Schmitter (IUE). O Prémio Especial do Júri foi para este artigo do Renato Miguel do Carmo. O Prémio Análise Social foi para este.

Faro. Aximage, 2-4 Outubro, N=500, Tel.

PSD/CDS-PP/MPT/PPM: 41,1%
PS: 39,1%
Indecisos: 4%

Restantes dados não disponíveis na notícia online do CM.

Actualização:
PSD/CDS-PP/MPT/PPM: 41,1%
PS: 39,1%
CDU: 6,1%
José Vitorino: 4,9%
BE: 2,6%
OBN: 4%
Indecisos: 2,2%

Aqui (obrigado Beijokense).

sexta-feira, outubro 02, 2009

Porto. Eurosondagem, 28-30 Set., N=736, Tel.

PSD/CDS-PP: 45,9-50,1% (48%)
PS: 31,4-35,2% (33,3%)
CDU: 8,3-10,5% (9,4%)
BE: 4,5-7% (5,8%)
PCTP/MRPP: 0,4%

Aqui.

Porto. Intercampus, 28-30 Set., N=800, Tel.

PSD/CDS-PP: 44,4%
PS: 35,9%
CDU: 8,2%
BE: 7,9%

Aqui.

Lisboa. Intercampus, 28-30 Set., N=800, Tel.

PS: 41,4%
PSD/CDS-PP/MPT/PPM:33,1%
CDU: 10,4%
BE: 8,3%

Aqui.

Setúbal. Eurosondagem, 28-29 Set., N=510, Tel.

CDU: 35,8-40% (37,9%)
PS: 27,5-31,3% (29,4%)
PSD: 14,5-17,9% (16,2%)
BE: 6,9-8,7% (7,8%)
CDS-PP: 4,4-6% (5,2%)

16,7% não responderam ou não sabem em quem votarão.

Só outra gracinha

Se o Trocas tivesse sido uma sondagem para as legislativas, por quanto tinha falhado? Eis as últimas cotações antes do fecho do mercado dia 27 às 19.00h de Portugal Continental:

PS: 34
PSD: 32,5
CDS-PP: 8,95
BE: 11,05
CDU: 8

O desvio absoluto médio em relação aos resultados nacionais finais foi de 1,76. Melhor que a Marktest. Não levem isto demasiado a sério (sondagens não são previsões, sondagens - incluindo Marktest - feitas a vários dias da eleição, mercados incorporam informação das sondagens, etc, etc, etc). Mas que tem uma certa graça, até tem.

Autárquicas

Tal como há quatro anos, a Marktest tem um dossier sobre as sondagens publicadas sobre as autárquicas. Creio que lhes faltarão algumas, mas a arrumação e apresentação são boas, como habitualmente.

(Via Beijokense)

Oeiras. Eurosondagem, 29-30 Set., N=548, Tel.

Isaltino: 39-43,2% (ponto central: 41,1%)
PS: 21,2-25% (ponto central:23,1%)
PSD/CDS-PP/PPM: 16,9-20,7% (ponto central:18,8%)
CDU:7,2-9,4% (ponto central:8,3%)
BE:4,3-6,1% (ponto central:5,2%)
PCTP/MRPP:0,4%

A soma disto dá 96,9%, pelo que se infere que OBN=3,1%. 12,4% da amostra são NS/NR. Tudo aqui.

Trocas 1.1.4

No Trocas de Opinião, há agora gráficos que mostram a evolução das médias móveis ponderadas para cada cotação. Sobre as cotações propriamente ditas, o que pensa o mercado?

- Que a probabilidade de Pedro Santana Lopes ganhar as autárquicas em Lisboa é muito baixa. Já houve centenas de transações deste contrato, na sua esmagadora maioria abaixo de 10, e o índice nunca ultrapassou os 10. A última cotação, no momento em que escrevo: 6,5.

- Que a probabilidade de que Rui Rio ganhe a câmara do Porto com maioria absoluta é elevada. A cotação está acima dos 70 pontos desde 30 de Setembro. Dito isto, houve um número muito grande de títulos transaccionados a valores inferiores aos 50 e só com as últimas transacções o índice começou a recuperar.

- As vitórias de Isaltino em Oeiras e Narciso em Matosinhos não são vistas como garantidas. Cotação abaixo dos 50. Mas no caso de Isaltino, a subir.

- Que a vitória de Paulo Pedroso é Almada é vista como improvável. Houve picos com transações a 40, mas descida posterior em cotações e índice. Actual cotação é 5.

- A probabilidade do PSD obter 160 câmaras (teve 156 em 2005) é baixa, apesar da cotação estar a subir. Mas contrato pouco transaccionado.

Vamos ver como e se o mercado reage quando começarem a sair as últimas sondagens antes das eleições.

P.S.- Hesitámos, mas aí vão dois contratos de longo prazo: "Cavaco Silva recandidata-se à Presidência da República em 2011?" e "Governo cai antes de Setembro de 2010?".

quarta-feira, setembro 30, 2009

Tableau de bord para os próximos tempos


Uma coisa curiosa - mas não surpreendente - é que o Barómetro da Marktest de Setembro de 2009 foi o primeiro em que 20% dos votantes no PS exprimiram uma opinião negativa sobre a actuação do PR. Nos meses anteriores, essa percentagem andou em torno ou abaixo dos 10%.

De volta

O Trocas de Opinião tem seis novos contratos: 5 sobre autárquicas e um da bola, para um total de oito. E para o dia seguinte às autárquicas há já vários outros contratos na calha, vários deles sugeridos por vós por e-mail, no Twitter e na caixa de comentários (que esta Legislatura promete vir a ser muito animada).

Novidade: não é possível ter ordens pendentes para mais de 400 contratos. Foi a maneira mais simples e rápida de tentar controlar um pouco a orgia das vendas a descoberto. Vão lá às compras e vão dizendo coisas.

segunda-feira, setembro 28, 2009

Rescaldo das previsões eleitorais


Os cientistas sociais estão habituados a explicar por que motivo erraram nas suas previsões. Quando, antes do Verão de 2008, eu e o Pedro Magalhães nos propusemos a prever os resultados das eleições legislativas de 2009, estávamos, naturalmente, preparados para que tal viesse novamente a acontecer. Esse trabalho, publicado na Ipris Verbis, teve destaque de primeira página no semanário Sol.

Uns tempos depois de escrito e publicado, as condições que nos permitiram fazer as previsões alteraram-se com a crise financeira internacional. As nossas previsões baseavam-se em dados do pós 25 de Abril e nos nossos dados nada havia de comparável a esta crise. Estávamos preparados para justificar eventuais erros nas nossas previsões com base nisso. A crise financeira internacional, que atirou o mundo para uma recessão apenas comparável à dos anos 30 do século passado, tornou estas eleições num perfeito outlier. Qualquer tiro na água seria facilmente explicado.

Mas a realidade trocou-nos as voltas. A nossa previsão resumia-se a dois números: 38% para o PS e 27% para o PSD. Valores notavelmente próximos do resultado final. Assim, em vez de explicarmos por que motivo falharam as nossas previsões, vemo-nos na peculiar contingência de ter de explicar por que motivo acertámos, apesar dmudança radical de cenário.

É um assunto que iremos explorar em trabalhos futuros, mas, à primeira vista, há duas hipóteses óbvias. A primeira hipótese, e como não podia deixar de ser, é a de que o nosso modelo de muito pouco vale e se acertámos quase em cheio tal aconteceu por mero acaso. Ou seja, a sorte explica o sucesso da previsão. Uma segunda hipótese é mais simpática. Com a crise internacional, os eleitores ficaram com dificuldades em responsabilizar os governos pelas más performances da Economia que ocorreram no último ano. Assim, quando chamados a votar, fizeram a avaliação do governo com base nos dados que havia disponíveis antes da crise. Se esta segunda hipótese estiver correcta, então não é de admirar que o nosso modelo se tenha portado tão bem, dado que usámos os dados económicos que estavam disponíveis até pouco antes da crise internacional se alastrar para Portugal.

Neste momento, e com honestidade intelectual, teremos de reconhecer que não sabemos qual das duas hipóteses estará correcta. Quando estudarmos a questão, e como acontece tantas vezes, é até provável que surja uma terceira explicação que de momento não descortinamos.


Publicado em estéreo na Destreza das Dúvidas.